The Raven
1963 / EUA / 86 min / Direção: Roger Corman / Roteiro: Richard Matheson (baseado no poema de Edgar Allan Poe) / Produção: Roger Corman, Samuel Z. Arkoff e James H. Nicholson (Produtores Executivos) / Elenco: Vincent Price, Peter Lorre, Boris Karloff, Hazel Court, Jack Nicholson
O Corvo é um pastiche que Roger Corman utiliza para satirizar o horror gótico em si e a sua própria série de filmes inspirados nos contos de Edgar Allan Poe. Uma comédia com (pouquíssimos) elementos de terror, para mim é a mais fraca das oito incursões do diretor no universo do escritor americano, talvez pelo excesso do tom jocoso e alegórico da produção.
Não que eu não goste de filmes de terror com pitadas de comédia. Longe disso. O próprio Roger Corman já nos brindou com algumas deliciosas comédias de humor negro, como o cult A Loja dos Horrores. Mas aqui, perto do requinte das outras produções anteriores (e futuras) o caminho do escracho em O Corvo acaba passando um pouco da medida.
Talvez pelo fato da junção inédita do triunvirato do horror na mesma película, Vincent Price, Peter Lorre e Boris Karloff, o resultado mantenha-se de qualquer forma um degrau acima. Mas parando para analisar friamente, só a presença destes três já propicia todo o abuso da teatralidade de seus personagens, junto ainda de um trapalhão Jack Nicholson irreconhecível de tão novo. Duelos de magia, pantomimas, exageros, de tudo um pouco encontramos nessa produção. O que é em si uma baita contradição pois o poema O Corvo é um dos mais tristes e melancólicos de Poe, com a agourenta ave trazendo apenas a desilusão da perda em uma triste e solitária noite fria de dezembro.
Aqui, o mago Erasmus Craven, papel de Price, está em seu quarto, também cabisbaixo, lamentando a perda de sua amada Lenore (interpretada por Hazel Court) brincando como uma criança com seus poderes telecinéticos e desenhando um corvo de energia em pleno ar, quando o pássaro negro bate em sua janela. Craven deixa-o entrar e aí temos a piada mais inteligente e divertida de todo o filme, quando ele declama: “Quem o mandou? É algum mensageiro alado e obscuro do além? Responda-me monstro, diga a verdade: terei novamente nos braços aquela que os anjos chamam de Lenore?”. E o corvo ao invés de proferir o famosíssimo “nunca mais” (nervermore), solta a pérola: “e como eu iria saber? O que eu sou, um adivinho?”. Genial!!!
Segue isso uma das histórias mais absurdas. O corvo na verdade é o também mago Dr. Adolphus Bedlo, vivido por Lorre, que já havia tido um embate com Price, mas como degustador de vinhos, em outro filme de Corman inspirado na obra de Poe: Muralhas do Pavor. Ele foi transformado de humano em ave pelo poderoso Dr. Scarabus, gran mestre supremo da irmandade, que foi durante muito tempo rival de Roderick Craven, pai de Erasmus. Quem faz o papel de Scarabus é Karloff, que também estava no elenco da clássica adaptação O Corvo da Universal de 1935, onde contracenava com Bela Lugosi.
Após trazer Bedlo de volta a sua forma original através de uma poção com inusitados ingredientes, como aranhas gelatinosas e fios de cabelo de uma pessoa morta (não antes de uma patética tentativa frustrada onde o rosto de Bedlo, com seus olhos esbugalhados, fica em um corpo cheio de penas negras), o mago ex-corvo jura de pé junto que viu sua esposa Lenore no castelo de Scarabus, o que força Erasmus, sua filha Estelle e o filho de Bedlo, Rexford (Jack Nicholson) a irem confrontar o poderoso mago.
Lá eles descobrem que na verdade tudo não passa de um embuste, e Lenore era uma sem vergonha vigarista que trocou Erasmus pelo poder e dinheiro de Scarabus, assim como Bedlo fazia parte da armadilha para atrai-lo. Quando Craven, sua filha e Rexford são presos, Bedlo se arrepende do trato com Scarabus, e acaba sendo transformado em corvo novamente, o que o faz ajudar Erasmus a ser libertado, no intuito de travar uma batalha mágica final com o inimigo, uma burlesca luta cheia de extravagantes efeitos especiais (para a época), com direito a levitação, cobras transformadas em echarpe, morcegos transformados em um leque japonês, balas de canhão que explodem confete, gárgulas aterrorizantes que tornam-se filhotinhos de cachorros, e por aí vai. A disputa vai se intensificando até seu final, onde obviamente, o personagem de Price torna-se o vencedor.
Ver Price como uma caricato sensível, Lorre como um irritadiço e rabugento alcóolatra, Karloff como um sacana sem moral e presunçoso e os decotes de Hazel Court valem o filme, obviamente. Mas ainda assim mantenho a opinião de que é o filma mais fraco do ciclo Poe dirigido por Corman e com produção da AIP. E olha que o roteiro também é assinado pelo excelente Richard Matheson.
O Corvo É aquele tipo de filme B que deixa a desejar, sabe, mas que dever ser conferido de qualquer forma. Deve ser visto uma vez pelo menos, e talvez, como diria o corvo: nunca mais!