Educação Sentimental - Reliquias em DVDs
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Educação Sentimental

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Áurea é uma professora solitária que inicia uma estranha relação com um jovem que conheceu por acaso. Bastante sensível, ela fica encantada pela beleza decorrente das mudanças da vida que provocam diversas perdas. Aos poucos uma antiga história vem à tona, modificando o presente.

CRITICA

A impossibilidade potente no cinema de Julio Bressane.
 

No primeiro momento em que Aurea, uma professora reclusa de meia-idade, conhece Aureo, um rapaz de 20 e poucos, ela conta para o jovem a história do amor impossível de um mortal por uma deusa, a lua. E será nesses termos, do interesse e da incompatibilidade em que a história dos dois personagens irá se desenrolar. Em sua casa, repleta de livros, quadros, esculturas e diversos outros objetos artísticos, Aurea acolhe o rapaz que torna-se uma espécie de pupilo amante - na trajetória de sua educação sentimental. Como a lua e o mortal, é evidente a diferença de conhecimento entre os dois.

Pensar a diferença geracional entre os personagens, é passar pelo que está se extinguindo. Aurea não é apenas uns 20 anos mais velha do que o seu pupilo, ela é sobretudo uma representante cada vez mais solitária de uma forma de se estar no mundo, de conhecê-lo e vivê-lo. Algo como a última herdeira de uma aristocracia erudita. Sua casa, suas roupas, seus móveis, seus gestos são traços de um mundo em extinção. O tempo impreciso dessa relação só é possível dentro daquela casa/fortaleza em que os personagens podem conversar sobre a arte, as memórias, as relações.

Junto com Aurea estão se extinguindo também as suas referências, os seus pilares, a arte (a fotografia, a pintura, o cinema) - ao menos, da forma como esses existiam e sobrevivem ali. Nesse sentido, o espaço da casa (que é quase o tempo inteiro o espaço do filme) é como ruína de um tempo que já passou, um museu que preserva esse tempo, ainda que de forma decadente - algumas paredes desgastadas, portas que não abrem direito, etc.

Se há pulsão em Aurea, mais do que em seu contato professoral ou físico com o pupilo, essa se mostra nos momentos em que ela dança: habitando o espaço quase fantasmagórico com os movimentos leves do seu corpo. Se nas outras artes os suportes estão todos em via de transição (da película para o digital, do quadro e da escultura para a instalação, etc.), na dança o corpo continua a ser o elemento principal. É aí onde a personagem deixa de ser a portadora da arte como um conhecimento enciclopédico e datado, para transformar essa em performance (misturar vida e arte no corpo).

Nesse sentido, o filme de Bressane nos lembra que o cinema é uma junção inexata da dessas artes, da literatura, da pintura, da fotografia e da dança. Sendo então, uma arte carregada de ambiguidades. Se é aquilo que se extingue em um processo aberto na nossa frente (como Aurea e sua erudição), é também essencialmente uma arte da performance dos corpos na tela. Se cabem os discursos quase declamados dos personagens, marcando a encenação como matéria prima, cabe o corpo que gira sobre si até ficar tonto e não ter mais controle. A erudição e a performance.

O filme de Bressane, feito em película, é ele mesmo essa impossibilidade potente. A impossibilidade do amor e da troca entre os personagens como ponto de partida e chegada. E também, a impossibilidade da própria narrativa fílmica - ela termina por se desconstruir no circucena, em que é preciso incluir o processo na narrativa para prossegui-la. E o filme desfaz-se (ou se refaz como making of) no momento em que o espaço da casa e da narrativa é invadido por outra personagem. Aí, já não é possível continuar: o mortal é lembrado que jamais chegará a lua.

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