O sobrenatural não é o imaginário, não é o que acontece em outro mundo; o sobrenatural é aquilo que quase-acontece em nosso mundo, ou melhor, ao nosso mundo, transformando-o em um quase-outro mundo. Quase-acontecer é um modo específico de acontecer: nem qualidade nem quantidade, mas quasidade. Não se trata de uma categoria psicológica, mas ontológica: a intensidade ou virtualidade puras. O que exatamente acontece, quando algo quase acontece? O quase-acontecer: a repetição do que não terá acontecido? Por outra: todo quase-acontecer teria sempre a forma de um quase-morrer? “Quase morri…” – essas são as histórias que vale a pena contar.
Palestrante: Eduardo Viveiros de Castro
Como diferentes culturas veem à morte?
Índios
Origem da morte:
Tradição ocidental: Os humanos morrem porque cometeram o pecado original.
Gênesis – Bíblia
Mitos de origem breve: explicam a condição mortal da espécie humana.
Tradição indígena: A origem da morte foi um equívoco, um ato de ignorância, e não de maldade. Os deuses atentaram que a morte ia passar de barco e não era para responder a ela, mas alguém se confundiu e responder.
Curt Nimuendajú (etnólogo) – guaranis não têm medo da morte, e sim dos mortos.
Nossa sociedade esconde a morte de todas as maneiras, ela se torna quase um evento obsceno, que tem que ser escondido.
Caso indígena:
Não há repugnância no evento da morte.
A morte é o aspecto não humano dos humanos.
Morrer como ato de traição.
A saudade, o luto é uma doença, são os mortos que nos fazem pensar neles.
Os mortos atraem os vivos para o lado da morte, exercem uma espécie de sucção e isso tem que ser combatido.
Proteção dos vivos contra os mortos.
Morto contrário do vivo.
O morto é o inimigo.
Quarup (Kuarup) – filme de Rui Guerra
Ritual de homenagem aos mortos ilustres celebrado pelos povos indígenas da região do Xingu.
A máquina social indígena impõe o dever do esquecimento das conseqüências (luto) do evento da morte, mas não quer dizer que não se lembrem deles depois.
Luto e melancolia (livro) – Freud
A diferença de humanos vivos e de humanos mortos é de extrema importância. A questão é a alma, que os animais também têm.
Criacionismo X Evolucionismo
O problema da morte é que você perde o corpo.
Epicuro (filósofo helenístico)
A morte não pode ser experimentada por quem morre, por isso só há a morte do outro
O imortal (conto) – Jorge Luís Borges
Imortais perdem interesse pela vida.
Índios veem a gente como a imagem do passado deles.
Visão ocidental, moral cristã: Eu perdoo, mas não esqueço. (Prisioneiro eterno da memória dos outros).
Visão indígena: Esquecem, mas não perdoam.
A maioria indígena evita uma teoria da criação, tudo sempre existiu, a mitologia descreve a transformação, como as coisas chegaram a ser hoje.
A morte é fundamental para que haja o acontecimento.
A morte faz uma narrativa.
Matrix (filme) – Irmãos Wachowski
O Show de Truman (filme) – Peter Weir
E.T., o Extraterrestre (filme) – Steven Spielberg
O encontro com a morte, do quase morri, é contável.
A morte é sempre vista como um rapto.
A morte só pode ser experimentada por nós no quase acontecer
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